Comprar um esportivo de verdade, seja de duas ou quatro rodas, demanda um investimento elevado. Estamos falando de algo em torno de R$ 30 mil para as motos (considerando uma Honda Hornet 600, que embora seja uma naked tem desempenho forte) e ainda mais distantes R$ 80 mil entre os carros (valor de um Citroën DS3 ou VW Fusca). É uma grana que, infelizmente, reserva esses brinquedos às garagens de pouca gente, sem falar nas cifras igualmente altas de seguro por serem considerados modelos de maior risco. CARPLACEreuniu então dois aspirantes à esportividade para responder à pergunta: dá para ser feliz gastando “pouco”?
A partir de R$ 17.990, a nova Kawasaki Ninja 300 é a opção do momento para iniciar motociclistas no mundo da adrenalina. Já o Palio Sporting oferece um motor saudável (1.6 16V) e conforto para quatro ocupantes por R$ 40.020, já com ar-condicionado, ABS, duplo airbag e outros itens de série. Aceleramos os dois lado a lado e mostramos semelhanças e distinções desta chamativa dupla. Confira!
Disputa acirrada
A Ninja, com exatos 174 kg, desfruta de bons 39 cv a elevadas 11.000 rpm. Potência invejável para os somente 296 cm³ de cilindrada distribuídos em dois cilindros paralelos. Para gerar tamanha cavalaria, a moto japonesa conta com duplo comando de válvulas (oito ao total), injeção eletrônica e muita leveza no miolo do motor. Temos, por exemplo, novos pistões de alumínio com saias curtíssimas. O ruído do bicilíndrico “girador” instiga e as seis marchas, curtas e justas, ajudam o propulsor a encher rápido.
O giro sobe animado a partir de 8.000 rpm e cresce até o corte eletrônico, a elevadas 13.000 rpm! Já o 1.6 16V do Palio (origem Mini/Tritec) não decepciona, e acelera bem até perto de 6.000 rpm. O Fiat atinge a potência máxima de 117 cv a 5.500 rpm, uma faixa normal para um carro de passeio. E ambos os motores funcionam de forma suave. Enquanto o hatch marca 3.000 rpm a 100 km/h em última marcha, a Ninja está a 7.000 giros. Mas, numa hipotética arrancada, a Ninja pularia fácil na frente e o Palio demoraria até chegar perto dela. Enquanto o Fiat vai aos 100 km/h em 10,9 s (segundo medição CARPLACE), a Ninja chega lá em ágeis 7 s. Mas a alegria na Kawasaki acaba antes: a moto chega a 173 km/h de máxima, contra 193 km/h declarados do Sporting.
A sensação de adrenalina na moto é superior à do Palio. O Fiat rende uma performance também divertida, mas tem outros compromissos: pode ser usado pela família, rodando tranquilo, ou apenas por você numa estrada, mais forte na faixa direita. E por muitos quilômetros sem cansaço. Na Ninja, os pulsos não demoram muito a sofrer, o banco é firme demais e pilotos mais altos podem sentir desconforto. A embreagem, por sua vez, é muito macia, bem como no Palio. Ambos oferecem freios ABS (na moto como opcional), com discos dianteiro e traseiro na moto, e tambores traseiros no hatch. Precisos, os sistemas colaboram ao rodar na chuva e em frenagens de emergência no seco.
Na cidade a “baby Ninja” é ágil, leve e esguia, podendo passar pelos corredores com desenvoltura surpreendente. Esterça pouco, mas seus espelhos podem ser recolhidos. Também basta uma vaguinha para a curta esportiva estacionar. O garupa reclamará do banco
bipartido, mas isso não parece ser problema: aqui a ideia é curtir sozinho! O Palio também vai bem no uso urbano. É ligeiro no trânsito, leva até 290 litros de bagagem no porta-malas e entra fácil em vagas apertadas.
Apesar da suspensão modificada em relação à versão Essence e das rodas maiores, em curvas mais arrojadas o Sporting mostra uma suspensão dianteira ainda macia, que “briga” com a direção bem rápida (mais direta que nos outros Palio) e tende a contornar pior que a moto. Ou seja, o Fiat pode ter bom comportamento se comparado a seus rivais de quatro rodas, mas um motociclista com o mínimo de destreza no comando da Ninja não deixará o Palio o acompanhar em trechos sinuosos.
Ninja boa de briga
Embora tenha aumentado de preço – as Ninja 250 eram vendidas por cerca de R$ 4 mil a menos, ou R$ 14 mil –, a Ninja 300 cresceu e apareceu a ponto de ser uma nova moto. A começar pelo visual e carenagens, mais bem acabados e que a tornaram uma escala reduzida da poderosa Ninja 1000. O painel, antes criticado pelo desenho antiquado, agora traz estilo atual, velocímetro digital e conta-giros de boa dimensão. Embora tenha perdido a temperatura da água, ganhou função de indicar pilotagem econômica (Eco). O novo escapamento também faz jus ao acabamento superior.
Porém, as principais mudanças ficam por baixo da carenagem. Como o quadro de aço, reforçado e mais rígido, passando pelos coxins de motor que transmitem pouca vibração. Aperfeiçoado, o propulsor teve o curso do virabrequim aumentado de 41,5 mm para 49 mm. Isso trouxe o benefício da maior cilindrada (exatos 47 cm³ extras) e maior torque – valor máximo passou de 2,2 kgfm para 2,8 kgfm a 10.000 rpm. A potência cresceu em ótimos 6 cv nas mesmas 11.000 rpm. Outras melhorias ocorreram na refrigeração líquida e no sistema de embreagem. Agora o conjunto é deslizante. Assim como nas esportivas de alta cilindrada, ele evita trancos na roda traseira em reduções de marchas mais bruscas.
Na prática, a Ninjinha ficou mais elástica. Agora roda bem melhor em baixos e médios regimes de giro, sem precisar esgoelar o motor a toda hora. Por conta de pedir menos aceleração, o consumo melhorou. Agora pode-se até passar de 24 km/l urbanos – sem maiores abusos, o que devemos confessar que é difícil!
As suspensões continuam esportivas: enquanto o monobraço traseiro ficou mais macio, os garfos dianteiros (invertidos) estão mais firmes. O pneu traseiro 1 cm mais largo (140/70 R17) colabora com o visual robusto e a ótima estabilidade. A pequena Ninja é precisa e leve em desvios rápidos e curvas. E, apesar de ser uma moto compacta, consegue o impensável para muitos: garante ao piloto boa dose de prazer ao guidão.
Uma pena que a nova Ninja de entrada não tenha ficado tão perto do bolso quanto a antiga 250. Na concessionária K 10 da capital paulista, por exemplo, o preço da versão standard era de R$ 18.990, e R$ 20.990 (com ABS). Embora sejam valores negociáveis, sua concorrente mais próxima, a Honda CBR 250 R (monocilíndrica de 26,4 cv), é vendida a R$ 16.490. Com ABS, a “CBRzinha” tailandesa chega a R$ 19.990.
Mineiro “come quieto”
Desde os tempos do 147 Rallye, passando pelos famosos Uno R de tampa traseira preta, a Fiat sempre foi de dar tempero esportivo aos seus modelos. Tanto que hoje a marca é que mais investe nesse segmento por aqui, com versões Sporting para Uno, Palio, Punto e Bravo – sem falar nos modelos turbinados T-Jet desses dois últimos. O Palio Sporting é o mineiro “come quieto” desta categoria, ainda à espera de um rival de verdade. O que mais se aproxima é o Nissan March SR, enquanto a Hyundai decide se tira do papel o HB20 com apelo esportivo – por enquanto só pintou o aventureiro X.
A receita para tornar o Palio um Sporting adiciona rodas específicas, com desenho exclusivo e aro de 16 polegadas com pneus 195/55 (contra aro 15 da versão Essence), faixas adesivas na carroceria e um detalhe cromado na lateral, que imita uma tomada de ar e causa polêmica. Também não espere nada discreto do lado de dentro, onde você vai encontrar detalhes em vermelho por tudo quanto é lado: painel, quadro de instrumentos, revestimento dos bancos, volante e até nos cintos de segurança.
A nosso ver um pouco exagerado na decoração, o Sporting é mais feliz nas modificações mecânicas. A Fiat deu uma encurtadinha na relação de diferencial para compensar as rodas maiores (e não ficar para trás do Essence) e aplicou mais carga nas molas, recalibrando também os amortecedores para um comportamento mais firme. Além disso, a suspensão foi rebaixada em 5 milímetros e as bitolas foram alargadas em 6 mm na frente e 10 mm atrás. Para acompanhar, a marca podia ter providenciado também algum “veneninho” no motor 1.6, ou pelo menos um comando variável de válvulas MultiAir para melhorar a ligeira fraqueza em giros iniciais. Do jeito que está, os bons 16,8 kgfm de torque só aparecem a elevadas 4.500 rpm, deixando as respostas em baixa um pouco chochas.
Na prática, o Sporting tem estilo de vida semelhante ao da Ninja: é legal de dar umas esticadinhas de marcha para animar o dia-a-dia na cidade (o motor tem até um roquinho provocante em alta) e encara bem aquelas curvinhas de serra, deixando claro ter o melhor acerto dinâmico da linha Palio. Ficou mais estável sem deixar de ser confortável, tem freios bem modulados e uma direção ágil e de boa sensibilidade. Pena que o câmbio de engates longos destoe um pouco numa tocada mais empolgante. Como veículo de uso diário, porém, ele cumpre com honestidade a proposta de bom desempenho e certa diversão sem salgar demais no orçamento. Até mesmo o consumo fica em níveis aceitáveis: registramos média de 7,5 km/l em ciclo urbano e 9,7 km/l no rodoviário.
No fim, é fato que Ninja e Palio Sporting estão em praias diferentes, mas são capazes de arrancar um sorriso do rosto de quem os pilota. E uma coisa é certa: uma garagem, digamos, recheada de vermelho e verde não seria nada mal!
Por Guilherme Silveira e Daniel Messeder
Fotos Rafael Munhoz exclusivo para o CARPLACE
Ficha técnica – Fiat Palio Sporting
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros em linha, 16 válvulas, 1.598 cm3, comando simples, flex; Potência: 115/117 cv a 5.500 rpm; Torque: 16,2/16,8 kgfm a 4.500 rpm;Transmissão: câmbio manual de cinco marchas, tração dianteira; Direção: hidráulica;Suspensão: independente McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira; Freios: discos ventilados na dianteira e tambores na traseira, com ABS; Rodas: aro 16 com pneus 195/55 R16; Peso: 1.090 kg; Capacidades: porta-malas 290 litros, tanque 48 litros; Dimensões:comprimento 3,875 mm, largura 1,704 mm, altura 1,508 mm, entreeixos 2,420 mm;Desempenho: aceleração 0 a 100 km/h: 10,9 s (aferida); velocidade máxima: 193 km/h
Ficha técnica – Kawasaki Ninja 300
Motor: dois cilindros paralelos, 8 válvulas, 296 cm3, injeção eletrônica, gasolina, refrigeração líquida; Potência: 39 cv a 11.000 rpm; Torque: 2,8 kgfm a 10.000 rpm; Transmissão: câmbio de seis marchas, transmissão por corrente; Quadro: tubular de aço; Suspensão: garfo telescópico na dianteira e uni-track com amortecedor a gás na traseira; Freios: disco na dianteira (290 mm) e na traseira (220 mm), com ABS; Peso: 174 kg; Capacidades: tanque 17 litros; Dimensões: comprimento 2,015 mm, largura 715 mm, altura 1,110 mm, altura do assento 785 mm, entreeixos 1,405 mm